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PRINCÍPIOS DE SEGURANÇA DE VOO

O conceito de segurança de voo amplia-se a uma abordagem sistêmica e ampla, considerando todos os aspectos que envolvem a segurança na operação de uma aeronave e promovendo ações de controle e melhoria contínua.

E também pode ser definida como o “estado no qual o risco de ferir pessoas ou causar danos em coisas se limita a, ou está mantido em ou abaixo de, um nível aceitável, através de um processo contínuo de identificação de perigos e gerenciamento de riscos” (ICAO, 2019).

Considerando se tratar de um ambiente sociotécnico complexo, devemos considerar a influência humana nas operações aéreas. E como o homem não foi projetado para voar, e utilizada da sua inteligência e habilidades para tal, os erros e falhas humanas poderão acontecer.

Deste modo, o erro é definido como uma decisão ou comportamento humano inadvertido e inadequado, que produz ou têm potencial para produzir impactos adversos ao sistema. Já a falha, é classificada como o término da habilidade de um item para o desempenho de uma requerida função, ou seja, um déficit de conhecimento, que representa um conceito fundamental para a análise de confiabilidade.

Ignorar esses fatores pode impactar negativamente na segurança de voo, por isso, é necessário conscientizar a tripulação sobre a relevância das funções exercidas a bordo, mitigando os riscos e, consequentemente, prevenindo os acidentes aeronáuticos.

As situações de perigo que trazem os maiores riscos devem ser priorizadas, atribuindo os padrões e critérios que devem ser observados para que possam ser devidamente gerenciados.

O perigo é considerado um pré-requisito para a ocorrência de um incidente ou acidente, se tratando de qualquer condição, potencial ou real, com a capacidade de causar dano físico, doença ou morte de pessoas, além do dano ou perda de sistema, equipamento ou propriedade, ou até mesmo dano ambiental.

Já o risco é a avaliação das consequências oriundas do perigo identificado, em termos de probabilidade e severidade, levando em consideração a pior condição (cenário) possível.

Neste contexto, as ocorrências aeronáuticas se dividem em:

  • Acidente Aeronáutico: ocorrência relacionada à operação da aeronave, desde o embarque até o desembarque, com a intenção de voo, desde que uma pessoa sofra lesões ou danos graves por estar a bordo, ter contato direto com a aeronave (incluindo partes desprendidas) ou pelas consequências do sopro do(s) motor(es).
  • Incidente Aeronáutico: ocorrência que afeta ou tem potencial de afetar a segurança de uma aeronave, estando associada à operação, mas que não é caracterizada como um acidente.
  • Incidente Aeronáutico Grave: ocorrência que quase resultou em um acidente aeronáutico, sendo diferenciado do acidente pelas consequências.

Com o intuito de evitar as ocorrências aeronáuticas, há um constante investimento e estudos voltados à segurança de voo, a qual é o conjunto de princípios, métodos e técnicas de trabalho que visa a conservação dos recursos financeiros e atingir os objetivos de produtividade, sem levar perigo à vida humana ou dano à propriedade.

Através da Norma do Sistema do Comando da Aeronáutica (NSCA 3-3), e visando o progresso da aviação brasileira, o Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (CENIPA), promove a Segurança de Voo, preservando os recursos humanos e materiais da aviação civil e militar do país, garantindo a coordenação e supervisão das atividades dos Elos do o Sistema de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (SIPAER).

EVOLUÇÃO DA SEGURANÇA DE VOO

Com o desenvolvimento da aviação, desde a Primeira Guerra Mundial e, principalmente, após o fim da Segunda Guerra Mundial, o uso de aeronaves para o transporte de bens e pessoas foi intensificado devido à expansão do comércio internacional. E com o crescimento das operações, foi necessário desenvolver regulações internacionais para estabelecer normas para as operações aéreas internacionais.

Diversas Comissões e Convenções foram criadas ao longo do século XX para tratar de assuntos voltados à aviação internacional, buscando sempre uma uniformidade dos padrões adotados entre os países membros. Por isso, em 1944, os Estados Unidos da América convidaram diversos países para participarem da Conferência de Aviação Civil em Chicago, onde 52 deles assinaram a Convenção Internacional de Aviação Civil, conhecida como Convenção de Chicago.

Esta convenção apoiou a criação, no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU), da Organização Provisória de Aviação Civil (OPACI), que funcionou por menos de dois anos, até ser substituída, em 1947, pela Organização de Aviação Civil Internacional (OACI), agência especializada para tratar dos assuntos relativos à aviação civil internacional, tornando um esforço de desenvolvimento dos países-membros.

Por um longo período, não houve uma metodologia investigativa dos acidentes aeronáuticos que ocorriam, e então, os inquéritos de cunho policial davam o tom de apuração de culpa. Com o tempo, foi-se observado que a sistematização no tratamento das ocorrências aeronáuticas colabora, sobremaneira, para a segurança do avião como meio de transporte.

Portanto, inúmeros acidentes ocorreram para que as ferramentas de prevenção fossem desenvolvidas e aplicadas à aviação de um modo geral, como foi o caso do Cockpit Resource Management (CRM), em
português, Gerenciamento de Recursos de Cabine, que atualmente já se expandiu para nos níveis organizacionais.

No Brasil, a criação do CENIPA e do SIPAER ocorreu em 1966, onde os fatores
humano, material e operacional passaram a ser considerados na estrutura causal dos acidentes aeronáuticos. O Relatório de Investigação de Acidente Aeronáutico e o Relatório Final foram desenvolvidos em substituição ao Inquérito Técnico Sumário e ao Relatório Sumário, cujo objetivo era voltado exclusivamente para a prevenção de acidentes aeronáuticos.

No quesito segurança de voo, como houve mudanças com o processo investigativo de acidentes aeronáuticos, deixando de ter caráter punitivo, os resultados se tornaram positivos, com decréscimo de taxas de ocorrência de acidentes, embora o número de vítimas tenha aumentado devido ao maior número de voos e maior capacidade das aeronaves.

Em 1982, houve a substituição do Manual do SIPAER pelas Normas de Sistema do Ministério da Aeronáutica (NSMA) por meio do Decreto no 87.249 de 07/06/1982, com a criação do Comitê Nacional de Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (CNPAA) que ficou estabelecido, sob a direção e coordenação do CENIPA, com a finalidade de reunir representantes de Entidades nacionais interessadas no conhecimento e no desenvolvimento da segurança de voo.

Em 1988, com a intenção de permitir aos alunos dos cursos de investigação de acidentes a prática e aplicação da teoria aprendida por meio da recomposição, distribuição dos destroços, em escala, de um acidente aeronáutico real em salas de aula, criou-se o primeiro Laboratório de Destroços da América do Sul.

Em 2006, houve a conversão do Departamento de Aviação Civil (DAC), de responsabilidade militar, para a ANAC, que passou a ser a Agência responsável por regular a aviação civil. Com isso, em 2007 houve a transferência da Divisão de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (DIPAA), pertencente ao DAC para o CENIPA.

Foram criados sete órgãos regionais subordinados ao CENIPA, estabelecidos sob o apoio administrativo dos sete Comandos Aéreos Regionais (COMAR) – os Serviços Regionais de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (SERIPA).

O posicionamento do CENIPA, por parte da nova Estrutura Regimental do COMAER, como órgão de assessoria direta e imediata do Comandante da Aeronáutica ocorreu em 2009. Neste mesmo ano foi inaugurado o primeiro Laboratório de Leitura e Análise de Dados de Gravadores de Voo (LABDATA) da América Latina.

Estabeleceu-se, em 2011, um grupo de trabalho com o objetivo de compatibilizar as atividades de prevenção conduzidas pelo CENIPA e pela ANAC. A modificação na infraestrutura aeronáutica gerada pela criação da ANAC, determinou ajustes no escopo de atuação do SIPAER em relação à aviação civil.

Assim, alguns dos aspectos relativos à prevenção, antes tratados diretamente pelo SIPAER, passaram a ser conduzidos sob o enfoque do Sistema de Gerenciamento de Segurança Operacional (SGSO), ficando a cargo da ANAC e do DECEA. Não obstante, estes dois órgãos continuam a integrar o SIPAER, tendo um importante papel no enlace com os provedores de serviços e produtos da aviação civil.

Com todas as adaptações e evoluções realizadas em prol da segurança de voo desde a década de 1960, pesquisas relatam a redução significativa dos acidentes aeronáuticos.

Desta forma, a promoção da segurança de voo, é o dever de todas entidades, empresas e profissionais que compõem o transporte aéreo.

TEORIAS DA SEGURANÇA DE VOO

A evolução dos paradigmas quanto aos fundamentos da segurança de voo foi um processo globalizado, visto que muitos países adotavam uma postura onde os voos eram realizados até que um acidente ocorresse. Então a aeronave era recuperada enquanto o acidente era investigado, e as ações corretivas eram realizadas, dando continuidade à atividade aérea.

As principais causas dos acidentes eram relacionadas aos fatores meteorológicos, às falhas mecânicas e ao erro humano. E quando o erro do piloto era considerado a causa do acidente, a antiga filosofia apenas encorajava os demais pilotos a não cometerem o mesmo erro.

E para que você compreenda a evolução das teorias, a segurança de voo é dividida em três eras:

  • Era técnica: durou até o final da década de 1960, onde os temas de segurança eram ligados aos problemas técnicos e tecnológicos dos componentes e sistemas da aeronave.
  • Era dos fatores humanos: entre o início da década de 1970 até a década de 1990. As estatísticas de acidentes tecnológicos haviam sido reduzidas com o desenvolvimento tecnológico, o que tornou a aviação mais segura. Então, o foco da segurança passou a ser na interação entre o homem e a máquina, bem como o desempenho humano nas atividades aéreas.
  • Era organizacional: iniciou-se em meados de 1990, onde a segurança de voo passou a ser analisada sistemicamente, considerando os fatores tecnológicos, humanos e também os fatores organizacionais. Com isso, os impactos das culturas organizacionais e as políticas de segurança no gerenciamento do risco passaram a ser levados em conta, buscando a prevenção dos acidentes.

E para que a aviação chegasse ao atual estágio de prevenção de
acidentes, foi necessário a evolução de paradigmas, ou seja, foi preciso
que as experiências anteriores acontecessem para que as novas
perspectivas fossem possíveis.

De forma que, mesmo que se considere os fatores organizacionais nas medidas de prevenção, os fatores tecnológicos e humanos também devem ser considerados.

TEORIA DO DOMINÓ (HEINRICH)

Em 1931, Herbert Willian Heinrich, engenheiro e pesquisador no âmbito de segurança ocupacional, publicou uma teoria baseada em um estudo baseado na experiência de acidentes no ambiente de trabalho, onde os acidentes e lesões seriam causados por situações anteriores. E os principais fatores destes acidentes eram os atos e as condições inseguras.

No início da década de 70, com a finalidade de propor ações que possam melhorar a segurança na aviação, identificar ações ou condições inseguras como forma principal de prevenção de acidentes, foi utilizada a teoria do dominó ou teoria da causa única, criada por Heinrich.

Esta teoria se baseia na causa-efeito, com foco na investigação e voltado para os fatores ligados ao acidente. Quando se enfileiram pedras de dominó para provocar uma queda sequencial, ao retirar uma peça, a sequência será descontinuada.

Da mesma forma, Heinrich (1931) defendia a ideia de que o acidente poderia ser evitado retirando uma “peça” da sequência, ou seja, retirando um dos atos inseguros, mesmo após a primeira pedra do dominó ter caído.

Como exemplo de fatores contribuintes que podem estar ligados à sequência de uma ocorrência aeronáutica, temos a:

  • Deficiência de instrução;
  • Manutenção inadequada ou inexistente;
  • Deficiência de infraestrutura;
  • Experiência de voo;
  • Indisciplina de voo;
  • Deficiência de Supervisão; entre outros.

Contudo, com o tempo, percebeu-se que a Teoria do Dominó de Heinrich não atendia todas as necessidades do gerenciamento para a prevenção, visto que vários fatores contribuintes estão por trás de um acidente, sendo a combinação de condições latentes e falhas ativas responsáveis pelas ocorrências.

TEORIA DO QUEIJO SUÍÇO (REASON)

Reason (1997) criou o modelo conhecido como a teoria das causas múltiplas ou “Queijo Suíço”, defendendo a ideia de que um acidente é provocado por uma combinação de condições latentes e falhas ativas constituídas por várias cadeias, que ultrapassam as barreiras de segurança devido às vulnerabilidades, e resultando no acidente.

O modelo de Reason destaca a influência da organização nos acidentes. Desse modo, se preocupa em investigar os aspectos organizacionais e a influência dos níveis gerenciais em acidentes. No entanto, mantinha a ideia das falhas ativas de Heinrich, formando assim uma evolução no paradigma da prevenção.

As falhas ativas acontecem nas proximidades do desfecho do acidente, envolvendo comportamentos (decisões, ações ou omissões) de operadores e são de difícil previsão e controle. Essas falhas têm origem em condições latentes relacionadas a fatores técnicos e organizacionais presentes no sistema.

E segundo Reason (1997), para se antecipar a ocorrência de acidentes organizacionais, é primordial o incremento de uma cultura de segurança de voo considerada eficiente e adequada.

Portanto, a ICAO (2009) afirma que em instituições onde existe uma cultura de segurança de voo, todos os profissionais são comprometidos com a Prevenção de Acidentes e, em todos os níveis da organização, consideram o impacto na segurança de voo em tudo que fazem.

A cultura organizacional molda as atitudes dos colaboradores em relação às práticas de segurança e consiste em crenças, práticas e atitudes compartilhadas, definida e nutrida pelas palavras e ações da alta administração, podendo ser afetada por fatores como:

  • Políticas e procedimentos;
  • Práticas de supervisão;
  • Planejamento e metas de segurança;
  • Ações em resposta a comportamento inseguro;
  • Treinamento e motivação dos funcionários; e
  • Envolvimento do funcionário ou “adesão”.

A principal ideia desta teoria é que a maneira mais inteligente e eficiente de se manter uma organização focada na prevenção de acidentes, é através do desenvolvimento e manutenção de uma cultura de segurança proativa, na qual profissionais de aviação estão capacitados, motivados e entendem a importância reportar situações de perigo.

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